Quarta | 26 de Fevereiro de 2020




Senti necessidade de ouvir uma voz familiar, algo que me reconfortasse. Peguei no telemóvel e, sem pensar muito, marquei o número da minha mãe. Sabia que ela estaria ocupada com o seu próprio dia, mas ainda assim, um simples "como estás?" poderia trazer um pouco de calma.

Oi, mãe… tudo bem? — A minha voz saiu suave, a saudade ainda presente, mas agora misturada com um leve sorriso.

Oi, minha querida! — A voz da minha mãe surgiu, sempre cheia de calor. — Está tudo bem por aqui, o teu pai está a inventar aqui por casa, como sempre. E tu, como vai a vida?

Ah, a vida vai indo. A distância tem sido dura… mas vou aguentando. Só queria saber como vocês estão. — Respondi, deixando escapar um suspiro. Sentir a presença da minha mãe, mesmo que pela voz, trazia-me uma sensação de segurança.

Estamos bem, filha. O teu pai não pára, e o teu tio está sempre ocupado com as coisas dele. E tu, meu amor? Está tudo bem com o Paulo? — Perguntou ela, sempre atenta, como só uma mãe sabe ser.

Senti-me mais leve ao ouvir-lhe a voz, o carinho implícito em cada palavra. — Sim, está tudo bem com ele. A saudade é que não passa, sabes… — Respondi, com um sorriso que ela provavelmente podia perceber, mesmo que não me visse.

Eu sei, querida. Só lembra-te que estamos sempre aqui para ti. Não importa a distância, estamos aqui ao teu lado. — Disse, com a calma que sempre me tranquilizava.

Fiquei mais alguns segundos a ouvir a sua voz, antes de me despedir. Era engraçado como um simples telefonema poderia fazer o mundo parecer um pouco mais próximo.

A distância imposta pelo trabalho e pela rotina fez-se sentir de forma mais pungente nos últimos dias. As mensagens que troquei com ele ao longo do dia foram doces, como pequenos raios de sol que iluminavam a nossa saudade. Mas sabíamos que nada substituía o toque. Nem o calor da sua pele, nem o cheiro familiar dele, nem a presença dele ao meu lado, que parecia sempre preencher os espaços vazios da minha vida. A tecnologia podia ajudar, mas estava longe de ser suficiente. O vazio ainda permanecia, invisível, mas tão real quanto a saudade que crescia em mim a cada hora que passava.

À noite, fizemos videochamada. Eu estava confortável, de pijama, o cabelo solto, mais leve e relaxada do que no resto do dia, mas ainda com aquela sensação de cansaço que só a saudade pode trazer. Ele estava deitado na cama, com o corpo relaxado, mas os olhos ainda refletindo a mesma inquietação que sentia. Por momentos, parecia que estávamos juntos, como sempre estivemos, mas quando ele falou, a realidade voltou com um golpe.

Queria que estivesses aqui. — Confessou, e a sua voz tinha algo de vulnerável, como se, ao dizer aquelas palavras, estivesse a mostrar uma parte dele que raramente expunha. Aquela necessidade de estar perto, de sentir o corpo do outro, era clara na forma como ele falou.

E eu. — Respondi, o coração apertado. Não eram necessárias muitas palavras. Ele sabia exatamente o que eu sentia, assim como eu sabia o que ele queria dizer. As palavras flutuaram no ar entre nós, tão simples, mas tão profundas.

O silêncio que se seguiu foi confortável, como um abraço. Não foi um silêncio desconfortável, nem pesado, mas um que se instalou entre nós, cheio de compreensão. Ficámos ali, apenas a olhar um para o outro, a partilhar aquele pedaço de noite sem dizer muito mais. Às vezes, o simples ato de se observar, de partilhar o mesmo espaço no silêncio, era mais intimista do que qualquer conversa que pudéssemos ter. Os nossos olhares diziam tudo o que não conseguíamos expressar. A saudade, o desejo de estar juntos, a necessidade de sentir a presença do outro.

Mas, como era de esperar, o cansaço venceu-nos. Os dias de trabalho e a rotina a que nos submetemos exigiam mais do que poderíamos dar. Ele foi o primeiro a quebrar o silêncio.

Dorme bem, meu amor. — Disse-me ele, a voz suave, como um sussurro que transportava todo o carinho que ele sentia.

Eu respondi com um sorriso, tentando engolir a saudade que apertava o peito. Mas antes de desligarmos, fiquei ali, a observá-lo pela tela do meu telemóvel. Ele parecia estar a ceder ao sono, os olhos lentamente a fechar, mas o rosto ainda sereno, como se a distância não fosse mais um obstáculo, mas apenas uma pequena pausa no que sentíamos. Olhei para ele por alguns instantes, tentando gravar cada detalhe — o contorno do seu rosto, a suavidade da sua expressão, até a forma como a luz da tela desenhava sombras no seu rosto. Mesmo através da tela, ele estava ali, presente de uma forma que eu podia sentir no fundo do meu ser.

Antes de fechar os olhos, senti-me estranhamente perto dele, como se a distância, de alguma forma, tivesse diminuído. Mesmo com os quilómetros entre nós, havia algo de mágico naquela chamada, algo que me fez sentir que, apesar de tudo, estávamos juntos. Quando finalmente apaguei a tela e fechei os olhos, a saudade não se dissipou, mas pelo menos naquele momento, a sensação de distância ficou um pouco mais leve, um pouco mais suportável.


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