Depois de um mergulho na cascata, voltámos à caravana, e preparámos o pequeno almoço. Passámos a manhã entre beijos, risos e promessas silenciosas. Mas esta bolha perfeita estava prestes a rebentar.
Era quase meio-dia quando o som de um motor se fez ouvir ao longe. Franzi a testa, e levantei-me rapidamente.
— O que foi isto?
O Paulo já estava junto à porta da caravana, observando a estrada de terra batida que levava ao local onde estávamos estacionados. Um jipe escuro aproxima-se lentamente.
— Temos companhia.
O veículo parou a alguns metros, e dois homens desceram. Vestiam uniformes escuros com uns emblemas que reconheci de imediato.
A Guarda Nacional Republicana.
O meu coração disparou.
— Merda.
Ele olhou para mim com uma expressão tensa, mas tentou manter a calma.
Os guardas caminharam até nós, mantendo uma postura firme.
— Boa tarde. — Disse um deles, num tom educado, mas sério. — Estão cientes das restrições em vigor devido ao estado de emergência?
Engoli em seco.
— Sim, claro…
O segundo guarda olhou para a caravana e depois para nós.
— Podem identificar-se, por favor?
O Paulo tirou a carteira do bolso e entregou o cartão de cidadão. Eu fiz o mesmo, sentindo a pulsação no pescoço a acelerar.
O primeiro guarda olhou para os documentos e suspirou.
— Sabem que, neste momento, deslocações não essenciais não são permitidas, certo?
— Nós… viemos para aqui antes do confinamento ser mais apertado. — Tentou explicar o Paulo. — Não estamos a pôr ninguém em risco, estamos completamente isolados.
O guarda cruzou os braços.
— Isso não muda o facto de estarem a violar as restrições.
Olhei para o Paulo, começando a imaginar todas as consequências. Seriamos multados? Seriamos obrigados a regressar?
— Vamos precisar de falar melhor sobre isto. — O segundo guarda indicou o jipe. — Podem acompanhar-nos, por favor?
O Paulo pegou na minha mão e apertou-a com força.
— Claro.
Seguimos os guardas, a sentir que aquela viagem romântica estava prestes a terminar da pior maneira possível.
O meu coração batia desenfreado, mas sabia que entrar em pânico só ia piorar a situação.
O primeiro guarda abriu um bloco de notas e olhou para nós com um ar sério.
— Então, expliquem-me lá… vieram para cá antes das restrições apertarem?
Paulo assentiu rapidamente.
— Sim, chegámos antes do confinamento se tornar mais rigoroso. Não tivemos contacto com ninguém, não estamos a infringir distanciamento social, nem a pôr ninguém em risco.
O segundo guarda, um pouco mais jovem, olhou para mim e depois para o Paulo, parecia menos rígido do que o colega.
— E vocês vivem juntos?
Hesitei por um segundo.
— Sim! — Respondi rapidamente, antes que o Paulo pudesse dizer outra coisa.
Ele olhou de relance para mim, mas percebeu a jogada e confirmou com a cabeça.
— Sim, sim. Moramos juntos.
O primeiro guarda suspirou e coçou a cabeça.
— A questão é que vocês estão longe da vossa residência oficial, e, tecnicamente, isso já justificaria uma coima.
Senti um frio no estômago. Já estava a imaginar os números astronómicos da multa quando, de repente, o segundo guarda deu um leve sorriso.
— Mas também é verdade que não estão a prejudicar ninguém. Não saíram para locais públicos, não estão em contacto com outras pessoas…
O colega olhou para ele com uma sobrancelha arqueada.
— Estás a sugerir que os deixemos ficar?
O mais novo deu de ombros.
— Só digo que talvez possamos usar um bocadinho de bom senso. Não estamos aqui para estragar a vida de ninguém, certo?
Houve um momento de silêncio em que senti que o nosso destino estava na balança. O guarda mais velho olhou para nós e suspirou pesadamente.
— Tudo bem. Não vamos multá-los.
Quase gritei de alívio, mas contive-me.
— A sério?
— Sim, mas têm de prometer que não vão sair da zona onde estão e que, quando voltarem para casa, cumprem todas as regras.
Paulo assentiu rapidamente.
— Prometemos! Obrigado, a sério.
O guarda mais novo sorriu.
— Se perguntarem, nunca estivemos aqui.
Os dois entraram no jipe e partiram, deixando-nos a olhar um para o outro, ainda em choque.
Assim que o carro desapareceu da estrada, larguei uma gargalhada nervosa e abracei o Paulo com força.
— Meu Deus, safámo-nos!
Ele apertou-me contra si e beijou-me a testa.
— Acho que ainda temos mais alguns dias de fuga.
Eu sorri, sentindo um misto de adrenalina e felicidade.
— Então é melhor aproveitarmos ao máximo.
E assim, o sonho não acabou ali.
Depois de conseguirmos escapar por um triz, a adrenalina corria nas veias de ambos. Mas, ao mesmo tempo, havia algo mais profundo que nos unia naquele momento. O medo, a excitação, e a sensação de estarmos fora do alcance do mundo exterior.
A caravana estava quieta e tranquila. O som da natureza envolvia-nos, mas o silêncio entre nós, agora, era quase palpável.
Olhei para o Paulo, sentindo um turbilhão de emoções dentro de mim. Ele também parecia perdido em pensamentos, mas os olhos dele, sempre tão tranquilos, estavam agora cheios de desejo e algo mais, algo feroz, incontrolável.
Sem uma palavra, o Paulo deu um passo na minha direção. Senti o ar entre nós mudar, e o coração disparou novamente. Ele olhou-me com uma intensidade que me fez prender a respiração.
— Agora que estamos sós…
Antes que eu pudesse responder, ele aproximou-se, tocou no meu rosto delicadamente, mas com uma firmeza que me fez estremecer. O toque dos seus dedos fez-me sentir a pele arrepiar. Ele puxou-me para mais perto. O que estava prestes a acontecer era inevitável.
Entreguei-me ao toque, as minhas mãos deslizaram pelas suas costas, sentindo a tensão no corpo do Paulo. A boca dele encontrou a minha com uma urgência que fez o meu coração acelerar ainda mais. Foi um beijo intenso, uma entrega pura. Ele empurrou-me suavemente até a cama da caravana, e, quando cai, deitou-se sobre mim, não esperando nem um segundo para explorar cada centímetro do meu corpo com um toque ardente.
Senti-me completamente consumida, cada toque e suspiro apenas alimentando a chama entre nós. A necessidade que tínhamos um do outro, acumulada ao longo do tempo em que estivemos separados, estava agora a ser libertada sem contenção. Cada movimento, cada gesto, cada beijo tinha uma intensidade nova, algo que não sabíamos que podíamos alcançar.
O Paulo olhou para mim, com os olhos cheios de desejo, já eu não consegui resistir ao impulso de tomar a iniciativa, puxando-o para mais perto. A sensação de estar perdida no toque dele, no calor da pele, era a libertação que ambos ansiávamos. Não havia mais restrições, mais medos. Só o agora.
Quando finalmente nos acalmamos, ainda ofegantes, a caravana parecia ter se tornado num mundo à parte, onde não havia mais problemas. Ele passou os dedos pelos meus cabelos, sorrindo suavemente.
— Isto foi… incrível.
Ainda a sentir os efeitos daquele abraço de fogo, beijei-lhe os lábios suavemente.
— Eu sabia que depois de toda esta tensão, não seria capaz de resistir.
Ele sorriu de volta, a expressão dele agora mais suave, mas com um brilho nos olhos que eu conhecia bem.
E ali, naquele lugar isolado, com o mundo fora da nossa bolha, finalmente encontramos um refúgio.
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