Segunda | 9 de Março de 2020




Na rua, já se notava um clima estranho. O som da cidade parecia abafado, como se todos estivessem a segurar a respiração. As conversas nos cafés e nas lojas giravam em torno de um só tema: o vírus. Algumas pessoas evitavam apertos de mão, trocavam olhares desconfortáveis, enquanto outras apressavam-se, com os rostos escondidos atrás de máscaras. Começaram a aparecer e-mails com recomendações sobre higienização, sobre manter distância e sobre cuidados que até então pareciam exagerados.

Fiz uma pausa para fazer um café, tentando ignorar o peso que parecia crescer na atmosfera. Com as mãos a tremer, segurei na chávena e tentei focar-me na rotina, mas a preocupação estava a invadir-me cada pensamento.

O meu telemóvel vibrou. Era uma mensagem do Paulo:

“O restaurante está um caos. Vou ter de testar um dos nossos colaboradores.”

Senti o coração dar um salto. O que quer que isso significasse, eu sabia que não era algo bom. Respondi de imediato, tentando controlar a ansiedade:

“O quê?! Mas ele está bem?”

Demorou um pouco, mas logo a resposta surgiu:

“Sim, mas teve febre e mandei-o para casa. A minha irmã diz que talvez tenhamos de fechar o restaurante e começar a trabalhar de porta fechada. Tipo Take-Away”

Aquilo atingiu-me como uma onda. O restaurante, um local onde sempre nos sentíamos seguros e acolhidos, agora parecia estar a desmoronar-se. Fechar, trabalhar de porta fechada… tudo parecia surreal. O meu coração apertou-se ainda mais, uma sensação de impotência misturada com uma crescente apreensão.

Fiquei ali, parada na cozinha, com o telemóvel na mão, sem saber mais o que dizer. Não sabia se aquilo era apenas um exagero ou se, de fato, devíamos começar a preocupar-nos seriamente.

A ansiedade tomou conta de mim. Liguei a televisão na esperança de que as notícias me dessem alguma resposta, mas, em vez disso, os números de casos só aumentavam. As imagens de hospitais lotados, ruas vazias, e os rostos dos repórteres sérios, transmitiam um medo palpável. Pela primeira vez, senti realmente medo.

Aquela sensação de incerteza tomou conta do meu corpo. Tudo estava a mudar, e nós éramos só mais uma parte do grande quebra-cabeça que ninguém conseguia montar. Quase como se estivéssemos a viver uma realidade distorcida.

Respirei fundo, e tentei afastar o pânico. O que mais poderíamos fazer? Eu olhei para a tela da televisão, mas já não conseguia prestar atenção. O som das notícias parecia distante, enquanto os meus pensamentos corriam a mil.

Tudo estava a mudar, e nada seria como antes.


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